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A avaliação da marcha é um momento importante para o fisioterapeuta diante do paciente que apresenta queixas álgicas musculoesqueléticas. Algumas lesões e disfunções podem causar alterações na marcha e, consequentemente, gerar mais disfunções e lesões. Este processo pode gerar um ciclo vicioso. 

É importante que o fisioterapeuta entenda o ciclo da marcha dita “normal” para então poder detectar alterações durante o processo de deambulação do paciente. Logo, o profissional estará apto para prescrever corretamente os exercícios da reabilitação para ele.

Portanto, neste texto iremos conhecer a fase de apoio da marcha. No próximo texto, complementaremos com as fases pré-balanço e balanço.

O ciclo da marcha

O ciclo da marcha é dividido em Fase de Apoio e Fase de Balanço.

  • Fase de apoio (Figura 1): é caracterizada pelo contato inicial do membro inferior com o solo, correspondendo a cerca de 60% do ciclo. Dentro da fase de apoio existem períodos de duplo apoio e apoio simples:

– Períodos de duplo apoio: ocorre nos 10% iniciais e 10% finais da fase de apoio. Acontece quando há contato de ambos os membros no solo;

– Períodos de apoio simples: corresponde aos 40% centrais da fase de apoio. Acontece quando há contato de apenas um membro com o solo;

Figura 1: Fase de apoio da marcha.

ciclo da marcha - figura 1

  • Fase de balanço (Figura 2): ocorre quando não existe contato do membro inferior com o solo. Essa fase corresponde a 40% do ciclo da marcha;

Figura 2: Fase de balanço da marcha.

ciclo da marcha - figura 2

Ciclo total da marcha “normal”

Equivale a junção da fase de apoio e da fase de balanço (Figura 3).

Figura 3: Ciclo da marcha “normal”

ciclo da marcha - figura 3

Ciclo da marcha- figura 4

É importante lembrar que:

  • Quanto mais instável e lenta for a deambulação, maior é a fase de apoio e menor será a fase de balanço;
  • Quanto maior a velocidade da marcha, menor será a fase de apoio e maior a fase de balanço. 

Subfases da Fase de Apoio da marcha

  • Contato inicial

ciclo da marcha - figura 5

Caracterizado pelo duplo-apoio, o toque inicial começa com o toque do calcâneo no solo, quando o peso do corpo começa a ser transferido para o membro que inicia o ciclo. Nesse momento, o joelho está terminando a fase de balanço do ciclo anterior (pensando na marcha de forma contínua). Dessa forma, no início do contato inicial, o joelho entra em extensão completa, através da ativação do quadríceps concentricamente.

Enquanto isso, o músculo tibial anterior tem que manter o tornozelo em posição neutra (90º) também através de uma contração concêntrica. Ainda para manter a fase do contato inicial, os músculos extensores do quadril devem manter-se contraídos concentricamente para estabilizar o quadril e evitar um colapso flexor, uma vez que a força de reação ao solo passa anteriormente ao centro articular e gera um momento externo flexor (representada na figura pela seta pontilhada em vermelho).  

Resposta a carga

ciclo da marcha - figura 6

Seguindo-se a fase de contato inicial, ocorre a fase de resposta à carga, caracterizada pelo apoio simples. Nessa fase, para que não haja uma sobrecarga excessiva nos membros inferiores, dois mecanismos entram em ação com intuito de amortecer o impacto gerado por esse evento. Esses dois mecanismos principais são:

Primeiro rolamento dos tornozelos: na fase de resposta a carga, a força de reação ao solo fica localizada posteriormente ao centro articular do tornozelo. Logo, isso gera um momento externo flexor plantar, que vai favorecer o movimento de flexão plantar do tornozelo; é como se o momento externo flexor que passa atrás da articulação do tornozelo fizesse uma força que “empurrasse” o tornozelo em flexão plantar. 

Essa ação é modulada pela contração excêntrica do tibial anterior, que vai gerar um momento interno dorsiflexor. Ou seja: se não fosse pela contração excêntrica do tibial anterior “segurando” a tendência a flexão plantar gerada pelo momento externo flexor plantar, o tornozelo “cairia” em flexão plantar de forma abrupta e o indivíduo “bateria” com o pé no chão fortemente;

Primeira onda de flexão dos joelhos: quando os pés atingem suavemente o solo através do primeiro mecanismo de rolamento dos tornozelos, a força de reação ao solo desloca-se posteriormente com relação ao centro da articulação dos joelhos. Este movimento produz um momento externo flexor que irá iniciar uma flexão dos joelhos. Para que não ocorra um colapso em flexão (e o indivíduo caia), o quadríceps se contrai excentricamente (momento interno extensor) para “frear” esse movimento. Uma vez controlada essa primeira onda de flexão dos joelhos na resposta à carga, o quadríceps inicia uma contração concêntrica para gerar a extensão da articulação do joelho.

Considerações:

Ainda na resposta à carga, a força de reação ao solo permanece anterior ao centro articular dos quadris, gerando um momento externo flexor. Neste instante, entram em ação os extensores primários (glúteo máximo) e secundários (isquiotibiais) do quadril gerando um momento interno extensor, realizando uma contração concêntrica dando início à extensão da articulação do quadril. 

Consideração prática importante: a contração concêntrica dos extensores do quadril na fase de resposta à carga produz uma aceleração do membro. Logo, é por esse motivo que os extensores do quadril são considerados um dos mais importantes propulsores da marcha normal, junto com os gastrocnêmios e flexores do quadril. 

Médio apoio

ciclo da marcha - médio apoio

Caracterizado pelo apoio simples, o principal objetivo dessa fase é promover o avanço do corpo sobre o pé estacionário. Nesse evento ocorre o Segundo mecanismo de rolamento. No final da resposta à carga, a força de reação do solo desloca-se anteriormente ao tornozelo gerando um momento externo dorsiflexor. A partir daí, a dorsiflexão do tornozelo aumenta progressivamente durante o apoio médio. Entretanto, para que essa dorsiflexão não ocorra de forma exagerada, é necessária uma modulação realizada pela contração excêntrica músculo solear. Assim, esse processo gera um momento interno flexor plantar, no intuito de “frear” a dorsiflexão exagerada. 

O aumento e modulação progressivos da dorsiflexão do tornozelo, mais o impulso gerado pela contração concêntrica dos extensores do quadril e joelhos, é responsável por um deslocamento da força de reação ao solo anteriormente ao centro articular do joelho. Logo, isso provoca um momento externo extensor. Dessa forma, a extensão do joelho a partir da fase de médio apoio é realizada de maneira passiva, sem contração do quadríceps. 

Esse restante de extensão é realizado de forma passiva, para que não ocorra o recurvatum; deve ocorrer um momento interno flexor. Este momento é gerado pelas estruturas posteriores do joelho com os músculos isquiotibiais, cápsula articular e ligamentos. 

Consideração prática importante: no apoio simples, ocorre a elevação da pelve e a adução do quadril no plano coronal. Então, nesse momento, a força de reação ao solo passa medialmente ao centro articular do quadril, gerando um momento externo adutor. Portanto, esse processo torna necessária a ação dos abdutores (gerando um momento interno) para a manutenção da estabilidade da pelve, evitando a queda excessiva da hemipelve contralateral. Por isso, para se ter um período de apoio simples adequado, é necessária uma boa estabilidade de membro inferior. 

Apoio terminal

ciclo da marcha - apoio terminal

O apoio terminal também é caracterizado pelo apoio simples. É durante este tipo de apoio que ocorre a extensão máxima dos joelhos e quadris. Nesse evento, ocorre:

Estabilização articular dos quadris: acontece para contrapor a força de reação ao solo que, nesse momento, é deslocada posteriormente ao centro da articulação do quadril, gerando um momento externo extensor. Essa estabilização é realizada pelas estruturas capsuloligamentares anteriores, que vão gerar um momento interno flexor;

Pico de dorsiflexão do tornozelo: nesse momento a força de reação ao solo ainda é anterior à articulação, produzindo um momento externo dorsiflexor. Nesse período, o músculo solear mantém sua contração excêntrica com objetivo de evitar o aumento da dorsiflexão no apoio terminal. 

No texto a seguir, falaremos das fases de pré-balanço e balanço da marcha.  

Lembrem-se de avaliar sempre seu paciente antes de prescrever condutas!

Referências:

  1. Sizínio HK, Barros Filho TEP, Xavier R, Pardini A. Ortopedia e Traumatologia: Princípios e Práticas. 5a Edição. Editora A, editor. 
  2. Vaughan C., Davis B., O’Connor J. DYNAMICS OF HUMAN GAIT. 2a Edição. 1992. 83–98 p. 

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