O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença autoimune multissistêmica complexa e crônica, apresentando-se com uma alta taxa de morbidade e mortalidade e uma grande heterogeneidade em sua apresentação clínica e prognóstico.
O LES é frequentemente mais prevalente no sexo feminino, acometendo mundialmente cerca de 5 milhões de pessoas. No Brasil, embora cerca de 65 mil pessoas convivam com o lúpus eritematoso sistêmico, a maior parte da população não possui conhecimentos sobre a doença.
A evolução clínica da doença apresenta fases de atividade e fases de remissão. A fase da atividade pode ser desencadeada por fatores como a genética, hormônios, psicológicos e até fatores ambientais, enquanto a fase de remissão pode estar associada aos mesmos elementos.
Os sintomas são diversos e possuem uma variedade em intensidade de acordo com a fase da doença. O LES é uma doença de caráter imprevisível, que atinge vários sistemas do organismo e muitas vezes pode levar à falência de órgãos vitais ou comprometer definitivamente as funções mais importantes.
Sabe-se que o lúpus eritematoso sistêmico pode estar associado a outras doenças crônicas, sendo as cardiovasculares de maior relevância se tratando de morbimortalidade. Há também as manifestações cutâneas que representam o segundo local de maior acometimento fornecendo informações consideráveis se tratando do prognóstico do paciente.
Os sintomas do LES podem se desenvolver rapidamente em dias ou lentamente em anos, mas para grande parte dos pacientes os diagnósticos se dão de forma tardia, o que desencadeia complicações graves e até irreversíveis aos pacientes. Por ser uma doença incurável, o tratamento visa restabelecer a homeostasia imunológica, promover a remissão da doença e prevenir complicações orgânicas, além de favorecer a qualidade de vida.
A finalidade terapêutica do tratamento é a remissão da doença por um tempo maior ou manter a atividade inflamatória do caráter da doença em níveis mais baixos possíveis. A conduta utilizada para garantir esses parâmetros é feita de acordo com as manifestações clínicas.
Essa conduta é realizada através da manifestação clínica do paciente, fazendo uma avaliação multidimensional da doença. Em casos de gravidade associa-se imunossupressores à conduta terapêutica devido ao risco de lesões em órgãos alvo.
Fisiopatologia do LES
A fisiopatologia da doença não é bem esclarecida e estudos demonstram que envolve anormalidades nos linfócitos T e B, sendo caracterizada pela perda de tolerância aos autoantígenos nucleares.
Há também alterações em citocinas sendo apontadas como marcadores secundários da doença, e tais comprometimentos interferem diversas questões celulares, como fagocitose e expressão das funções leucocitárias e da homeostase tecidual, deixando o paciente diagnosticados com lúpus eritematoso sistêmico em maior risco para infecções secundárias, doenças autoimunes e inflamações crônicas.
Há alguns outros fatores que podem favorecer o aparecimento da doença, como a genética, excepcionalmente parentescos de primeiro e segundo grau. Há também envolvimento com fatores ambientais como a maior incidência de exposição a raios ultravioletas, infecções virais, hormônios sexuais, substâncias químicas e fatores emocionais, levando a redução da tolerância imunológica, gerando dano tecidual.
Está relacionado também com a resposta inflamatória do indivíduo e contém cerca de 30 proteínas plasmáticas e da membrana celular. Quando ocorre a ativação desse sistema gera um efeito cascata o qual gera uma inflamação, fortalecimento de atividade fagocítica e a ruptura de bactérias hospedeiras, a falha desse sistema é observada em pacientes com diagnóstico de lúpus eritematoso sistêmico.
A deficiência de uma proteína sérica envolvida no processo de resposta inflamatória inata, Lectina Ligante de Manose (MBL), causada por mutação genética aumenta os índices de suscetibilidade ao surgimento do LES.
O lúpus eritematoso sistêmico acomete tanto as articulações do indivíduo quanto o sistema hematológico. Se tratando do acometimento articular, os locais mais comuns de aparecimento são as mãos, punhos e joelhos, bilateralmente e contínuo. Enquanto o acometimento hematológico da doença, está relacionado a redução dos índices de hemoglobina, reticulocitose, aumento de Desidrogenase Lática (DHL) e bilirrubina indireta.
Sinais e sintomas do Lúpus Eritematoso Sistêmico
O diagnóstico do lúpus eritematoso sistêmico, muitas vezes é feito tardiamente devido a grande variação de sinais e sintomas. A LES é marcada por um início insidioso, com uma evolução crônica e marcado pela oscilação entre os períodos de exacerbação e remissão.
Ela atinge principalmente a pele, células sanguíneas, articulações, membranas serosas, rins e cérebro que desencadeiam uma série de sintomas, sendo os mais comuns artralgia, cansaço, fadiga, lesões cutâneas e sintomas hematológicos e renais. Tais acometimentos, especialmente renal e do sistema nervoso, relacionam-se com os índices de mortalidade da doença, chegando a ser 5 vezes maior em relação à população geral.
Manifestações cardíacas e psiquiátricas também podem ser encontradas. No que se refere ao sistema cardiológico, as alterações mais recorrentes são miocardite, pericardite, endocardite e lesões coronarianas. Já as síndromes psiquiátricas relacionadas ao lúpus eritematoso sistêmico têm um espectro bastante variável, desde cefaleias, mielopatia, psicose, estado confusional agudo e distúrbios cognitivos, até mesmo meningite asséptica.
Além disso, o acometimento renal é observado em cerca de 50% dos pacientes, marcado pelo polimorfismo das lesões, sendo que a síndrome do anticorpo antifosfolípide se sobrepõe às demais manifestações da Nefrite Lúpica, outros problemas renais podem surgir em razão dos medicamentos usados no controle da doença.
Diagnóstico
O diagnóstico do lúpus eritematoso sistêmico (LES) é um processo complexo e meticuloso, devido à variedade de manifestações clínicas que podem ser inespecíficas. Sintomas como articulações dolorosas e edemaciadas, lesões cutâneas, febre e fadiga muscular podem atrasar a confirmação do diagnóstico, resultando em um agravamento do quadro clínico por causa do tratamento tardio.
Exames laboratoriais complementares são essenciais para uma avaliação precisa, ajudando a identificar disfunções inflamatórias e monitorar a intensidade da doença.
Vários fatores dificultam o diagnóstico do lúpus eritematoso sistêmico, incluindo a imprevisibilidade da doença e a possibilidade de remissões prolongadas seguidas de agudas exacerbações. Isso pode levar a uma piora inesperada no estado clínico do paciente.
Além disso, os exames laboratoriais não apenas auxiliam na confirmação do diagnóstico, mas também são fundamentais para avaliar a eficácia do tratamento e monitorar os danos associados ao uso prolongado dos medicamentos. A complexidade da condição torna o acompanhamento clínico um desafio constante, exigindo uma abordagem cuidadosa e abrangente.
Tratamento Fisioterapêutico do Lúpus Eritematoso Sistêmico
O lúpus eritematoso sistêmico envolve várias complicações, como problemas no sistema imunológico, hematológico, aumento do risco de infecções e complicações cardiovasculares, renais e pulmonares. Essas questões não apenas agravam a doença, mas também afetam a qualidade de vida dos pacientes, refletindo-se em dificuldades nas áreas de lazer, social, profissional e escolar.
Muitas vezes, esses indivíduos se isolam, buscando evitar complicações ou lidando com as consequências dessas condições. A fisioterapia é de grande importância, pois, através de manobras específicas e exercícios musculares, promove a melhora da função e do conforto respiratório.
Ela atua como um coadjuvante no tratamento farmacológico, minimizando sintomas, reduzindo a possibilidade de crises e mantendo a qualidade de vida desses pacientes.
Os benefícios da fisioterapia para pacientes com LES incluem a atenuação e controle dos sintomas da doença, como a diminuição da dor, melhora da força muscular e promoção de ganhos funcionais.
A cinesioterapia, em particular, se destaca como um método eficaz para acelerar a recuperação, encorajando os pacientes a utilizarem as habilidades adquiridas na realização de atividades funcionais cotidianas.
Além disso, recursos fisioterapêuticos como a cinesioterapia geral e respiratória, hidroterapia, TENS (Transcutaneous Electrical Nerve Stimulation), drenagem linfática, exercícios de coordenação e equilíbrio, e reeducação da marcha são fundamentais para otimizar a reabilitação e o bem-estar desses indivíduos, proporcionando uma abordagem abrangente e eficaz no tratamento.
Os programas de cinesioterapia para pacientes com lúpus eritematoso sistêmico devem priorizar alongamento, fortalecimento e resistência, com foco em exercícios aeróbicos. Isso inclui exercícios isotônicos e isométricos, além da cinesioterapia respiratória para melhorar a função respiratória.
A drenagem linfática ajuda na eliminação de resíduos, reduzindo a dor e melhorando a circulação. O Método Pilates contribui para o condicionamento cardiopulmonar, enquanto a hidroterapia proporciona relaxamento físico e mental, rompendo ciclos de dor e fadiga. A eletroterapia, como o TENS, também é eficaz na redução da dor.
Exercícios aeróbicos aumentam a consciência corporal e a resistência, além de melhorar a eficiência cardiovascular. Pacientes com lúpus eritematoso sistêmico frequentemente apresentam descondicionamento físico, resultando em diminuição da capacidade cardiovascular.
Além dos benefícios físicos, é importante destacar que a personalização dos programas de fisioterapia é fundamental para atender às necessidades específicas de cada paciente com LES. A avaliação detalhada das limitações físicas e das comorbidades permite que os fisioterapeutas desenvolvam intervenções adaptadas, otimizando os resultados e promovendo a adesão ao tratamento.
Essa abordagem individualizada assegura que os pacientes não apenas melhorem sua função física, mas também se sintam mais confiantes e motivados em sua jornada de reabilitação, possibilitando um maior envolvimento em suas atividades diárias e sociais.
Conclusão
A abordagem fisioterapêutica nas complicações do lúpus eritematoso sistêmico tem um papel importante na promoção da qualidade de vida dos pacientes. Ao focar na recuperação funcional e no alívio de sintomas, a fisioterapia contribui significativamente para a minimização das limitações físicas e emocionais que a doença impõe.
Essa intervenção não apenas ajuda a enfrentar os desafios diários, mas também potencializa o autocuidado e a resiliência do paciente, promovendo uma maior independência e bem-estar.
Além disso, a fisioterapia pode incluir técnicas de manejo da dor, exercícios de fortalecimento e relaxamento, que são essenciais para o controle dos sintomas e a prevenção de complicações.
Dessa forma, a fisioterapia se torna uma aliada indispensável na gestão do lúpus, permitindo que os pacientes vivam de maneira mais plena e ativa, com confiança e otimismo diante das adversidades da doença.
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